quinta-feira, 11 de dezembro de 2008

Le dernier souffle



Acordei me sentindo mais leve. Meu coração que bate do lado direito do peito amanheceu mais sereno, enquanto aquele que está do lado esquerdo batia no seu ritmo normal. Olhei para a porta que por tantas vezes você entrou e vi atravessar a luz límpida da solidão. Vagarosamente, movi meu corpo pelo espaço vazio da nossa cama como se flutuasse, porque às vezes estar só é ter asas e poder voar. Lembrei do som distante da tua voz, das tuas palavras ásperas e foi como se meus ouvidos tilintassem como aquele sino no alto daquela torre daquela igreja que vejo daqui desta janela. Coloquei lençóis novos sobre a cama, tirei as roupas que traziam os teus cheiros e tomei um banho com água morna. Deixei que a água lavasse meu corpo que agora está mais leve por não precisar mais carregar esse amor. Por que você não disse antes que eu não estava nos teus planos, que nosso amor não era primaz? Teria evitado que eu carregasse sobre os ombros um mundo de falsas esperanças e de desejos e talvez eu pudesse ter-me sentido mais leve há muito tempo. Será que você nunca percebeu a beleza que existe em saber-se inteiro e sentir-se mais completo quando se está a dois? Que estar a dois é um exercício de dar-se mais para conhecer-se mais? Queria poder-te dizer que fui tão verdadeira, tão inteira, tão tua, tão eu, tão nós, que esperei aquela tua vontade de estarmos juntos surgir, mas que ela nunca surgiu e que por isso me cansei de esperar, que me doei por completo, que fui o melhor e o pior de mim, que te amei, que errei, que me entreguei, que me recolhi, que pensei e repensei, que senti, que falei, que disse coisas vãs, que tentei fazer sentido, mas você não sabe me escutar porque está muito longe, porque já te tirei da minha vida, do meu convívio. Queria dizer tudo isso numa única frase, sem ponto, sem vírgula, sem ponto-e-vírgula, até perder o ar e depois sair, deixando para trás todas as lembranças e sensações. Acho que no fundo sempre esperei por esta manhã, porque me sinto nova, renovada, como se me visse pela primeira vez. Percebo que há algo de muito diferente em mim: sim, eu possuo dois corações. O da esquerda bate por mim e o da direita, agora também.

Juliana Varaschin

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