segunda-feira, 30 de março de 2009

Um pedaço da minha alegria



Gosto de acordar no meio da noite só para saber da tua presença ao meu lado. Ver o teu contorno escuro em oposição às paredes claras, o perfil do teu rosto, teus lábios que se unem ao teu nariz de linhas retas, formando um contorno de proporções perfeitas. Ah, meu bem, como eu adoro o teu rosto, teus olhos, teus cílios, lamber os cantos dos teus lábios que se abrem num sorriso para eu tocar os teus dentes.

Amo todos os teus pedaços. Na madrugada, gosto de traçar o teu perímetro com a ponta dos dedos: teus braços, teu peito, teu ventre. Desenho-te devagarzinho e quase te toco. Se tu percebes meus movimentos, tu acordas do teu sono bom e resmungas algumas palavras que eu não entendo muito bem. Eu acaricio teus cabelos docemente e te digo ‘dorme, meu bem, está tudo bem’.

E está mesmo, porque é bom despertar para admirar os teus pedaços. Toco os teus pés com os meus, teus pés finos, estreitos recebem os meus, que muitas vezes estão frios. Assim, posso voltar a fechar os meus olhos porque novamente sinto teu calor e tua presença. Ainda guardo a imagem do teu corpo, o sabor dos teus lábios e dentes, meu coração se aquieta feliz. Tu, inteiro, te aproximas de mim, me envolves, eu me aninho nos teus braços e me entrego.

São destas pequenas felicidades que eu te falo. Alguns dizem que elas não existem, outros dizem que elas só existem diante dos meus olhos, mas nós dois sabemos que é preciso treinar os nossos olhos para poder vê-las. Contigo, eu as vejo sempre.

Juliana Varaschin

quarta-feira, 11 de março de 2009

Táxi

O poeta passa de táxi em qualquer canto e lá vê
o amante da empregada doméstica sussurrar
em seu pescoço qualquer podridão deste universo.

Como será o amor das pessoas rudes?
O poeta não se conforma de não conhecer
todas as formas da delicadeza.


(o poema não é nosso, mas é lindo)

Toque.
















(baseado em fatos reais)

Ela foi se despindo aos poucos. O par de olhos castanhos que a fitavam se desviaram por um instante para vislumbrar a nudez que ali se anunciava. A pele branca, agora inteiramente revelada, falava a ele como uma poesia recitada ao pé do ouvido. O aroma suave daquele corpo exposto invadia todos os aposentos da casa e o embriagava. Branca, branca, toda branca,


Aproximam-se. O contato visual é perdido com o tocar dos lábios. Aquele desejo era quase desamparo. Devorava aos dois, fazia com que eles queimassem em sua própria chama. Era o que nutria e, ao mesmo tempo, não matava a fome. Era do que eles se alimentavam e o que se alimentava deles.

Isso foi o que ele pensou, nos breves instantes antes de encostar a sua boca naquela pele branca. Os lábios mornos do beijo recém dado prenunciavam o que estava por vir. O seu desejo era um simples desdobramento da necessidade de partir.

As cortinas da casa balançam suavemente e o vento a arrepiou. Ele encostou o seu torso despido nela. O calor dos corpos unidos trouxe um estranho consolo aos dois. Eles escolheram a entrega; entrega ao encontro e à eles mesmos. Aquilo era quase amor.

É chegada a hora da separação. Ela se levanta, despe-se de sua branqueza e mais uma vez a esconde por baixo do vestido azul. Azul como seus olhos, ele pensa. Caminham até a porta e se despedem com um beijo e um olhar. Só que dessa vez o olhar foi mais longo. Sem dúvida aquele momento foi quase amor.

Clarissa Simas