sábado, 25 de outubro de 2008

Amanheço

Amanheço em mim. Abro as cortinas, a tua luz invade o meu quarto e afugenta as minhas sombras. Abro as janelas e permito que a brisa do teu alento levante a poeira há muito acumulada sobre os móveis. Preciso separar as minhas coisas das tuas, meus discos dos teus, meus quadros dos teus, meus pensamentos dos teus. Mas não leve embora os teus livros. Arrumei um espaço na estante, perto daquele vaso vermelho. Os meus ficarão à direita, os teus, à esquerda. Deixe teus livros aqui para que eu possa sentir a tua presença através deles, pois eu sou o meu próprio veneno e tu és o antídoto.

Entardeço em mim. Vejo o sol dar lugar à lua ainda criança. Quanta pretensão a nossa, meu bem, querermos viver no mesmo universo, se nem mesmo o sol e a lua conseguem existir sob o mesmo céu. Mas não te preocupe, eu também não me aflijo. Ainda podemos nos deitar sobre a mesma cama e recostar nossas cabeças no travesseiro da aceitação mútua. Se tu ficares esta noite, prometo te contar um segredo, pois eu sou o ruído e tu és o silêncio.

Anoiteço em mim. Fecho as janelas e as cortinas. Prefiro o escuro para me despir de mim mesma. Tire as tuas roupas também, livre-te da tua pele, carne e ossos. Não quero o frio, o cru, o orgânico; quero o quente, o inominável. Misture teus sentimentos e emoções com os meus, a fim de aproveitarmos a impecabilidade deste momento. Sei que somos as margens opostas de um rio, mas sempre há um lugar onde elas se encontram e nada mais as separa. Fique mais um pouco, meu bem, porque quando a lua for embora para dar espaço ao sol, quero amanhecer em nós.
Juju Varaschin

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